O trabalho individual inserido no trabalho colectivo pressupõe o apagamento de tendências individualistas. O individualismo contraria e prejudica o trabalho colectivo. O individualismo é em geral produto da obrestimação do valor próprio e da subestimação do valor dos outros.
O individualismo manifesta-se pelas mais variadas formas: na tendência para fazer as coisas sem recorrer ao apoio dos outros ou recorrendo a eles de forma meramente subsidiária; na sobrevalorização sistemática da opinião própria e da acção própria; na resistência a aceitar e a actuar segundo a opinião de outros, sobretudo quando contrária à própria; na dificuldade em inscrever a actividade própria na actividade do colectivo.
É relativamente frequente o caso de militantes que, por acreditarem demasiado em si próprios e pouco nos seus camaradas, chamam a si a realização de demasiadas tarefas, muitas vezes superiores às próprias forças.Sucedeu com frequência após o 25 de Abril que, em assembleias de organizações, um só camarada (e por vezes não um dirigente da organização que realizava a assembleia, mas o «controleiro» dessa organização) presidia, dirigia os debates, dava a palavra aos oradores, lia moções e tirava as conclusões.
Pode acontecer, num momento dado, que sozinhos realizem conjunturalmente melhor as tarefas que partilhando-as com outros. Mas, com tal actuação, impedem a aprendizagem, o desenvolvimento e a experiência de outros quadros, abalam a confiança dos outros quadros em si próprios e correm o risco de cometer (como também frequentemente sucede) graves faltas e de provocar sérios insucessos.
Não se deve dar a um só militante o poder para decidir sozinho de graves questões, quando a decisão pode ser tomada num colectivo com outros camaradas. E, se tal poder é conferido, será mau sintoma se aquele a quem é conferido o toma à letra e não procura (salvo casos excepcionais que o impeçam) aferir pela opinião dos outros a justeza da sua opinião individual. Também não é raro o caso de camaradas que consideram a opinião do colectivo como boa quando coincide com a sua própria, mas já a consideram contestável e de menor obrigatoriedade quando a contraria ou se lhe opõe.
Sucede assim que, depois de um debate no seu organismo, verificando que a sua opinião não foi aceite, se eximem ao cumprimento da tarefa decidida, justificando tal atitude com o argumento de que, por lhes faltar convicção, não são os mais indicados para a cumprir. Em certos casos tal atitude pode ser legítima e correcta. Mas ela surge as mais das vezes como expressão de um exacerbado individualismo. O individualista tem por vezes a ilusão de que o individualismo é uma manifestação de liberdade individual. A verdade é que, quem pense, decida e actue apenas pela sua cabeça e pela sua vontade individual acaba por ser prisioneiro das suas próprias limitações. Isolado, atrás da aparente liberdade, o indivíduo acaba por ser escravo de si próprio. A liberdade de pensar e de agir pressupõe a apropriação e assimilação de elementos de juízo e isso pressupõe por sua vez a aceitação da informação e da opinião colectivas como inseparáveis da liberdade.
Ao contrário do que afirmam os defensores do individualismo, a opção pela formação de uma opinião colectiva e de uma actuação colectiva constitui uma afirmação de que o indivíduo se libertou das próprias limitações individuais. Constitui assim uma expressão da liberdade individual.
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