“Os
militares adeptos de Iéltsin apresentaram-se no Comité Central de deram-nos dez
minutos para evacuar o edifício, proibiram-nos de levar connosco o que quer que
fosse – a não ser objectos de puro uso pessoal. Eramos cerca de dois mil. Toda
a gente saiu sem dizer uma palavra. Estávamos desmoralizados, terrificados. Não
houve um só que protestasse. Quando cheguei a casa e contei à minha mulher o
que acontecera, ela ficou embasbacada e ao mesmo tempo, indignada: “ Quê?
Estavam lá dois mil comunistas e não resistiram?”. Esta observação deixou-me
envergonhado.
«Tinha
razão. Sim, por que motivo não tínhamos nós resistido? Esperávamos ordens!
Ordens de Gorbatchov, que continuava a ser o Presidente da URSS e
secretário-geral do PCUS, que podia ter reagido, que podia ter apelado aos
militantes para resistirem à decisão de Iéltsni. Não sei quantos membros do
Partido teriam respondido a esse apelo, nem como, pois tudo nos parecia já
perdido e estávamos completamente desmoralizados. Mas o facto é que nada
fizemos. Esperávamos pela decisão de Gorbacthov quando, na realidade, fora ele
próprio, com as suas hesitações, os seus compromissos e, por fim, as suas
sucessivas traições, quem preparara a capitulação e se aprestava a assiná-la.
Que ingenuidade! Mas que havíamos de fazer? Estávamos habituados a não tomar a
iniciativa.» Pág.
81
«Mas,
mesmo discordando profundamente da política que estava a ser posta em prática,
toda a gente se calou. Não por medo de passar por «inimigo do Partido» e de
ficar sujeito a sanções mais ou menos graves – esse receio havia-se atenuado
pouco a pouco, especialmente depois do XX Congresso -, mas porque, qualquer que
fosse a sua opinião, os militantes tinham conservado o hábito de aceitar sem
discussão todas as directivas vindas de cima.»
« Os
simples cidadãos – comunistas ou não - , quando se referiam aos que ocupavam os
lugares de direcção à frente do Partido e do Estado, haviam ganho o hábito de
dizer «eles», como se falassem de uma categoria
de pessoas à parte, situadas a grande distância da população, lá no
«alto», nas quais se tinha fraquíssima influência. Para que serviria, então,
exprimir desacordo em voz alta? Apenas para passar – o que não convinha – por
indisciplinado? Pag. 203
“Livro O
Grande Salto Atrás de Henri Alleg”
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