Camarada Adelino, faltaste à última reunião, deixa lá, não
perdeste nada, já nem há onde reunir!
Nesta casa viveu um médico, sua esposa e a menina Joaquina,
trabalhadora doméstica a tempo inteiro.
O casal não tinha filhos deixou em testamento a casa ao seu
sobrinho Adelino mencionando no testamento que a menina Joaquina deveria viver
nela até morrer.
O Adelino era um homem honesto, disciplinado, metódico,
perfecionista. Foi comandante dos bombeiros de Porto de Mós com o rigor que o
caracterizava. Depois do 25 de Abril abraçou a causa dos trabalhadores e
filiou-se no PCP. Responsável pelos dinheiros do Partido no concelho
desempenhou essa tarefa com empenho e dedicação, com rigor e entusiasmo.
Tinham um velho que cão que passeava todos os dias pela
manhã e ao fim da tarde. O cão morreu, o Adelino tornou-se mais sedentário,
começou a sentir dores intensas, foi-lhe diagnosticado um cancro que o levou em
poucos meses.
Consciente que pouco tempo lhe restava doou ao PCP a casa
onde habitava, com uso fruto da Madalena, sua companheira, enquanto fosse viva.
Doou também uma interessante biblioteca com livros e vários objectos de elevado
valor e interesse.
A viúva decidiu deixar a casa e ir viver com o seu irmão
para o centro da vila. A menina Joaquina ficou só naquele labirinto de divisões
e com um receio imenso de morrer ali sozinha. O seu quarto era o último da casa
ao fundo do corredor do lado esquerdo. Pelas 16 horas aquecia uma panela de
água para fazer a sua higiene pessoal e deitava-se. Não usava a banheiro com
receio de cair. Bem cedo, 6 horas da manhã, era a primeira a chegar à padaria
para trazer todos os dias o pão fresco para casa. Uma noite, pela 4 horas da
manhã, caiu da cama, partiu a bacia, foi hospitalizada mas a idade avançada não
lhe permitiu resistir e, dois meses depois, partiu ara sempre.
Num grande quintal, nas traseiras da casa, existiam
laranjeiras, flores de vários tipos e ao fundo uma enorme nogueira. Dali
avistava-se o trilho do antigo comboio que transportava, para a central cá em
baixo, o carvão retirado das entranhas da serra nas minas da Bezerra.
Tranquilamente, ali ao fim da tarde, podíamos imaginar os homens esfarrapados,
enegrecidos pelo pó que se agarrava à pele misturado com o suor que saia do
corpo dorido por uma jornada intensa de trabalho de sol a sol. A serra era
escavada à picareta e os vagões carregados à pá a poder de muito esforço
humano. A miséria de salário mal lhes dava para o sustento. Muitos partiram
novos de devido a doenças contraídas por muitos anos “enterrados vivos” nas
entranhas da terra.
Nos últimos tempos foi colocada uma placa com a palavra
vende-se. A placa desapareceu.
Camarada Adelino faltaste à última reunião, não importa, não
perdeste nada, já nem sequer há um local para reunir!
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