Além!

Porque o silêncio é às vezes o caminho mais dificil, é preciso encontrar avenidas de tambores a rufar entre tantas mordaças, para construir a sempre inacabada e desejada felicidade, de viver sempre a juventude presente. Tempo de desejo é sempre tempo de Futuro.

1 de agosto de 2010

Ainda assim, podíamos vir todos pra rua...

(...) «Basta de gente que ganha num dia aquilo que outros ganham num ano. Tem que haver alguém que ponha cobro a isto e que tenha coragem.» (...) «O investimento deve ser feito em bens verdadeiramente úteis e não em realidades virtuais, que estiveram na base da crise financeira mundial.» (...) «É preciso ultrapassar o capitalismo neoliberal, pois a crise é também uma crise de valores.»
Anabela Fino
As palavras são do bispo auxiliar de Lisboa, D. Carlos Azevedo, que a semana passada desafiou os políticos portugueses a abdicar de 20 por cento dos seus salários em benefício de um fundo social. A proposta surgiu no seguimento da reunião extraordinária do Conselho Consultivo da Pastoral Social que pediu «mais responsabilidade social e política perante a crise» e «soluções corajosas» para a ultrapassar.

Mesmo considerando, numa leitura mais fina, que o bispo poderia ter ido muito mais longe – e logo aproximar-se muito mais da verdade – se tivesse dito, por exemplo, que «basta de gente que ganha num dia aquilo que muitos e muitos outros Não ganham numa vida inteira de trabalho», há que reconhecer que não é difícil – diria mesmo que é bastante fácil – comungar das opiniões reproduzidas acima. O que é difícil, isso sim, é conjugar estas palavras com o resto do discurso do eclesiástico que actualmente tutela a acção social da Igreja e, sobretudo, conciliá-las com a prática da Igreja católica.

Com efeito, na mesma entrevista em que reconheceu a escandalosa injustiça da repartição da riqueza e invectivou os gestores que ganham ordenados «obscenos» – palavras suas – o bispo Carlos Azevedo também disse que «a crise é tão grave que não poderemos superá-la uns contra os outros: empresários contra sindicatos, sindicatos contra patrões, Governo contra Oposição e Oposição contra Governo.» A solução? Um «pacto social sustentado e justo» entre cidadãos, partidos, sindicatos e empresários. Houve quem, como Mário Soares, se confessasse «impressionado» pela «lucidez e coragem» de D. Carlos Azevedo e, sem rebuços, «aplaudisse». Outros, menos exuberantes, foram dizendo «nim», que isso de fazer caridade pode ser muito católico mas 20 por cento sempre é 20 por cento, mas lá que um pacto dava jeito, isso dava... 

Pois é, milénios de vida têm essa vantagem: num parágrafo alimenta-se a sede de justiça dos oprimidos, noutro cuida-se dos interesses dos opressores. Porque isto de pactos entre patrões e sindicatos, exploradores e explorados, direita e esquerda, algozes e vítimas não passa de poeira para os olhos destinada a prevenir o que de facto assusta a Igreja, ou seja o reconhecimento de que «situações extremas de pobreza e de fome podem conduzir à revolta e à violência, numa sociedade de desigualdades», como bem alertou o bispo.

Para a Igreja, o que está em causa não é acabar com a exploração, é torná-la suportável; não é acabar com a miséria, é mantê-la controlada; não é pugnar pela justiça social, é criar mecanismos de escape para aliviar a pressão. Daí a proposta dos 20 por cento, que afinal mais não é do que a reafirmação do princípio de que sempre haverá ricos e pobres ou, dito de outro modo, uma sociedade de classes em que uns vendem a força de trabalho ou estendem a mão à caridade, e outros se apropriam do lucro.

De facto, já basta! Mas esta realidade só a luta a pode alterar.
nota: apenas a imagem e o sentido desta. E não as personagens que esta refere, pois ao que parece, estiveram do outro lado da barricada e noutro país. Salvo erro América Latina. Pretendo deixar apenas a ideia que seria útil que tb estas se juntassem à luta por um mundo melhor e terreno, pois o outro lá estará (ou não) à espera.

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