“A noção de todos os grandes valores cívicos continua enraizada entre os trabalhadores e as massas populares mas nada diz aos governantes e aos detentores das grandes fortunas. Enfim, é inútil chorar sobre leite derramado. Políticos e banqueiros são corruptos e nem sequer se dão já ao trabalho de esconderem a sua corrupção. Ponto final, parágrafo”.
Não se fala aqui no drama da Madeira, ainda que também por lá abundem os lodos da moral e a apropriação desonesta do dinheiro e do poder que, em teoria, deviam pertencer ao povo. A noção de todos os grandes valores cívicos continua enraizada entre os trabalhadores e as massas populares mas nada diz aos governantes e aos detentores das grandes fortunas. Enfim, é inútil chorar sobre leite derramado. Políticos e banqueiros são corruptos e nem sequer se dão já ao trabalho de esconderem a sua corrupção. Ponto final, parágrafo.
Este tipo de comportamentos criou raízes entre os multimilionários numa certa reunião anual do “Fórum Económico Mundial” que teve lugar em Davos, na Suíça, em 2006. Nela se falou muito num princípio inovador que, daí em diante, se instalaria como critério único dos métodos de gestão: o “imperativo criativo”, linha condutora do capitalismo global.
Nas fundamentações desta nova regra de oiro admite-se que as acções políticas e financeiras do capitalismo neoliberal têm objectivos e métodos próprios e são, portanto, por natureza amorais. Logo, a actividade da iniciativa privada deve recusar toda e qualquer condicionante que a limite no seu caminho para a acumulação de capitais, no sentido da conquista dos grandes negócios e da subida das margens de lucro. Tudo lhe é permitido desde que inove e adopte os métodos adequados à concretização dos objectivos a alcançar. As críticas da opinião pública e das instituições democráticas, ignoram-se. Nessa área, o que é verdadeiramente importante é a divulgação de uma imagem pública dos mais ricos que os descreva como uma força imbatível, unida, plenamente capaz de impor, de vencer e de conquistar o poder e a riqueza. A imagem de uma força esmagadora. Estes são os pressupostos da Nova Ordem global em construção.
Sabe-se como Sócrates, os seus ministros e os seus amigos são bons alunos dos métodos do grande capital. Absorveram instantaneamente a lição de Davos e começaram a governar à sua maneira, envolvendo-se em negócios escandalosos, atropelando a Constituição, destruindo conscientemente o aparelho do Estado e esmagando a economia para enriquecer aceleradamente o sector financeiro. Sabiam não correr grandes riscos. O seu anel de segurança era poderoso. A maioria parlamentar absoluta estava assegurada. Dispunham de homens fortes nas instituições de topo. Os índices económicos e financeiros do capitalismo mundial eram confortáveis. As guerras e rumores de guerras, as doenças endémicas, a pobreza, o desemprego, até mesmo tudo isso ser dramático correspondia à estratégia global que beneficiava o lucro privado, criava novas oportunidades para os ricos e promovia a divisão dos povos. O neoliberalismo era a coroa de glória do capitalismo e do sucesso.
Foi nessa altura de embriaguez do poder que começaram a vir a lume notícias do mar de lama onde patinhavam os governantes portugueses. Nada, é claro, alterou a inflexível conduta dos banqueiros. Eles é que mandavam, eles é que sabiam, eles é que constituíam a maioria intocável.
Mas a gula insaciável do neoliberalismo acabou por matar a «galinha dos ovos de oiro». O sector económico foi destruído pelo sector financeiro. A produção agrícola e as pescas foram tratadas como parentes pobres. Em toda a área do euro e nos EUA galoparam as falências e a extinção de postos de trabalho. Os próprios elos da cadeia de segurança do grande capital – a segurança do «polvo» - começaram a contradizer-se e a chocarem-se entre si.
Veio então a grande crise financeira. O desemprego subiu em flecha e a moeda desvalorizou-se. Começou a falar-se em «retoma» o que já representava um reconhecimento capitalista do desastre da economia. Tornava-se já evidente que a tão falada «retoma» era simples arquitectura verbal. O capitalismo não tinha capacidade para controlar e resolver a situação que ele próprio criara. Vivia a sua 25ª hora. É, actualmente, cada vez mais uma sombra de si mesmo.
No Portugal socrático os problemas ainda são mais graves do que noutros países do euro. Mergulhámos na crise geral já num agudo estado de pobreza e dependência nacional, situações resultantes da incapacidade e da subserviência dos governantes. Quando entrámos na crise mais geral, transportávamos connosco essa outra crise doméstica. As duas crises encaixaram uma na outra e agora pesam como chumbo. Sem ruptura com as políticas neoliberais o país não tem salvação.
O facto é cada vez mais evidente, ainda que os ministros procurem mostrar-se impávidos e serenos e mintam de olhos nos olhos, seguindo as técnicas de Davos. A verdade é que estão apavorados. Portugal não tem governo que governe e os ministros agem como uma guarda de retaguarda. O resto são escândalos e mentiras num mal cheiroso lamaçal doirado.
O futuro de Portugal é uma incógnita. Depois de Sócrates, o caos? Cada dia que passa mais o país se endivida e vive de empréstimos que terá de pagar. Cada novo roubo em alta escala que se descobre arrasta o descrédito das políticas do governo. As técnicas de ocultação da verdade começam a falhar. O cidadão comum está cansado de mentiras. A corrupção, nos seus mais variáveis tentáculos, revela-se e alastra invariavelmente a nível dos aparelhos de comando do Estado ou da sociedade civil.
O povo é completamente alheio a estas formas de comportamento criminoso. Mas é ele que paga os custos da mentira e da cupidez dos ricos. Não há dinheiro para apoiar condignamente os desempregados, para pagar os salários em atraso, para aumentar as pensões, para fazer avançar o Serviço Nacional de Saúde ou para desenvolver o interior do país. Mas os recursos sobram quando se trata de salvar os bancos falidos ou de pagar principescamente os agentes das políticas do governo e os políticos corruptos. Tudo à sombra de uma justiça enferrujada quando os crimes são assacados aos poderosos mas célere em condenar logo que se trata de ocultar e distorcer os factos ou de arquivar acusações que possam comprometer os responsáveis do sistema e do regime. Veja-se os casos dos processos da Casa Pia, da Freeport, da promessa de compra da TVI, dos sucateiros, das escutas, da PT, do BPN, da REFER, do tráfico de influência na indústria farmacêutica, dos submarinos, dos computadores Magalhães, das encomendas por ajuste directo, etc., etc. É um nunca mais acabar.
As polícias arrastam as investigações. Os tribunais invocam a Lei e a Defesa dos Direitos do Homem para aceitarem recursos sobre recursos que fazem esquecer os factos e acabam por inviabilizar a punição dos culpados. Instituições que se pretendem respeitáveis, como a Igreja e a Maçonaria, surgem igualmente comprometidas em negócios da banca, na corrida às privatizações, nos enredos da “Face Oculta” e na concorrência entre ambas logo se trata de defender interesses ou de “herdar” as competências institucionais do Estado nas diferentes áreas sociais.
A Sociedade Civil não esconde a sua gula por áreas tão vitais para o Estado democrático como a Segurança Social, a Saúde, o Ensino e as Comunicações. Em traços largos, é este o actual panorama nacional.
Por conseguinte, a situação do nosso povo é grave. O inimigo endurecerá posições quanto mais desesperado se sentir. Por nós, não temos ilusões. A sociedade socialista de hoje e de amanhã só se tornará possível se rompermos imediatamente com a hidra tentacular das políticas neoliberais. E para isso, é preciso alertar o povo trabalhador, informá-lo e mobilizá-lo para uma luta que não será exclusivamente parlamentar (ainda que mereçam toda a nossa admiração e o nosso reconhecimento os esforços abnegados dos verdadeiros representantes do povo no Parlamento) mas inevitavelmente se transferirá para as ruas, para os campos e para as empresas.
Nos quadros actuais, sem um grande solavanco popular toda a situação se agravará. As fraudes vão prosseguir. As mentiras vão continuar. Os negócios escuros vão multiplicar-se. O crime violento aumentará. Os eventuais ou evidentes culpados dos crimes contra o Povo e contra o Estado, continuarão a responder cinicamente às acusações, com um frio cinismo nos lábios: «Nada sei. De nada soube. Nada fiz. Nada tenho na consciência». Em Portugal, se a luta não endurecer, o crime continuará a nascer solteiro.
Com os comunistas na vanguarda, vamos participar na luta que é, evidentemente, pelos direitos conquistados, pelas liberdades, pelo cumprimento da Constituição, pela moralização do sistema, pelo combate à pobreza e ao desemprego, e pelo desenvolvimento económico.
Mas outras razões nos devem obrigar a agir e a lutar.
A sobrevivência da independência nacional nos quadros da Democracia de Abril, a solidariedade com todos os povos do mundo e, sobretudo, a da criação de uma sociedade livre que possa ser transmitida à gerações portuguesas que hão-de vir.
Unidade e luta. Venceremos!…
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