Com a aproximação das datas da visita a Portugal de Joseph Ratzinger, convirá ter-se uma perspectiva do prestígio de que a Igreja Católica beneficia junto das populações da Europa. Sabe-se que este está em queda acentuada, mesmo em países tradicionalmente considerados seus bastiões, como é o caso da França, da Áustria ou da Irlanda.
Em França – «a filha primogénita da Igreja» – onde tem dominado um clero vincadamente tradicionalista, a quase totalidade dos cidadãos era considerada católica praticante (as estatísticas oficiais de 1965 referiam percentagens de frequência dos cultos da ordem dos 82%). Números recentes do Instituto Francês de Opinião Pública registam uma descida de 17% do número de cidadãos que se autodefinem como católicos. A queda percentual é muito mais acentuada em relação aos praticantes que frequentam regularmente as missas: apenas 4,5% dos crentes assiste a cerimónias religiosas.
Na Áustria, o panorama é idêntico. Nos últimos anos, mais de 50 mil católicos têm vindo a abandonar anualmente a Igreja, sendo já da ordem do milhão aqueles que desertaram. Contra os 81% de católicos contados em 1961, as estatísticas mais recentes registam apenas 66% de população crente. Note-se que tão grande era a força e o prestígio da igreja austríaca que a todos os contribuintes era descontada pelo Estado um imposto religioso. Hoje, a população prefere sair da Igreja a ter de fazer esse pagamento ao fisco!
Mas há outras razões a ter em conta:
66% dos crentes discorda que à Igreja Católica sejam concedidos privilégios especiais. Perante a lei, todas as religiões devem ser iguais. 75% declara-se em desacordo com a doutrina do Vaticano relativamente aos contraceptivos, ao aborto, à homossexualidade, etc. A favor do Papa e das suas teses, apenas 27% dos inquiridos aprovaram a tese de que Bento XVI defende os valores do catolicismo; 34% condenaram as posições éticas da Igreja. Acresce que as famílias abandonaram a tradição católica do ensino da pastoral familiar aos seus filhos. Calcula-se que apenas 1% das famílias austríacas cumpram essa regra ritual.
66% dos crentes discorda que à Igreja Católica sejam concedidos privilégios especiais. Perante a lei, todas as religiões devem ser iguais. 75% declara-se em desacordo com a doutrina do Vaticano relativamente aos contraceptivos, ao aborto, à homossexualidade, etc. A favor do Papa e das suas teses, apenas 27% dos inquiridos aprovaram a tese de que Bento XVI defende os valores do catolicismo; 34% condenaram as posições éticas da Igreja. Acresce que as famílias abandonaram a tradição católica do ensino da pastoral familiar aos seus filhos. Calcula-se que apenas 1% das famílias austríacas cumpram essa regra ritual.
ONG e IPSS
Todo o clero europeu se ressente deste contínuo divórcio das bases. Os padres continuam, como é inevitável, profundamente conservadores e rigidamente obedientes à disciplina romana. Mas a sociedade evolui e as populações urbanas adensam-se, enquanto que as vocações sacerdotais e monacais são cada vez mais raras. A Igreja recorre então ao laicado e ao voluntariado católico para suprir as lacunas pastorais. Os leigos invadem os terrenos do clero regular e estabelece-se a confusão, agravada pelos múltiplos escândalos e pelo baixo nível de operacionalidade das ONG e IPSS, como recentemente se revelou na catástrofe do Haiti.
Em Portugal, no plano confessional também é crescente o número de situações pouco transparentes. As ONG e IPSS declaram-se não lucrativas mas intervêm no mercado. Utilizam o trabalho gratuito do voluntariado para preencher empregos deixados vagos pelos efeitos da crise financeira. Invocam os valores da caridade cristã. Mas, na verdade, todo o trabalho produz mais-valia, dá lucro. Surge então a dúvida acerca dos dinheiros da «sociedade civil» e da sua legitimidade. Para onde irão os lucros produzidos? Por exemplo, que estatuto e que gestão têm os «hotéis temporários» das 400 Misericórdias existentes no País? São pagas pelo Estado, pelos utentes, pelas autarquias, pela «sociedade civil»? Dão lucros? E como aceitar que ONG e IPSS se «empresarializem» e se «profissionalizem» os seus quadros, como é agora intenção do sector solidário da Igreja? «Empresas sociais», com mão-de-obra barata e quadros intermédios e superiores pagos a preços do mercado do trabalho... «Almofadas sociais» bem lucrativas, principescamente subsidiadas pelo Estado e pela Igreja e isentas de contribuições e alcavalas fiscais. A caridade pode, com efeito, transformar-se a curto prazo numa actividade comercial interessante e lucrativa.
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