Além!

Porque o silêncio é às vezes o caminho mais dificil, é preciso encontrar avenidas de tambores a rufar entre tantas mordaças, para construir a sempre inacabada e desejada felicidade, de viver sempre a juventude presente. Tempo de desejo é sempre tempo de Futuro.

19 de fevereiro de 2010

Sócrates «o cadáver político está aí, a família que o enterre»

Com a cadência de uma peça de relojoaria, José Sócrates é novamente sujeito de suspeição de actividade ilegal e ilegítima, tornando-se uma vez mais, e sempre pelas piores razões, motivo de todas as conversas. Não hà volta a dar, o homem é assim, tem azar. 

Qualquer pessoa medianamente informada da vida política portuguesa pode dizer de sopetão, sem grande risco de ser contrariado, uma ou duas dúzias de políticos a quem seria impossível baterem-lhe à porta tais azares. Há azares que acontecem sempre aos mesmos.

Agora, voltou a bater à porta de Sócrates o azar de amigos e destacados camaradas do PS o relacionarem, em comunicações vigiadas pela Polícia Judiciária no âmbito da investigação «Face Oculta», com um alegado plano que visava interferir em vários órgãos da comunicação social e afastar uma jornalista e o director da TVI daquela estação televisiva. O Procurador e o Juiz de Instrução do processo «Face Oculta» vêem nesse alegado plano indícios de um atentado «contra o Estado de Direito».

Perante tão gravíssima situação, dez dias passados sobre o conhecimento público generalizado destes factos, Sócrates, secretário-geral do PS e primeiro-ministro de um seu governo, «aos costumes disse nada» e remete-se a um silêncio comprometedor, que incomoda já camaradas de Partido e preocupa adversários políticos.
Este comportamento traz-me à memória o que escrevi em Novembro de 2007 sobre a escolha de Sócrates para primeiro-ministro. A citação é longa mas julgo-a necessária:

«Ao contrário dos anteriores secretários-gerais do PS, mais do que uma escolha foi um estado de necessidade que levou o poder à opção por José Sócrates.

Foi previamente testado, passou pelos Bilderberger e concluiu-se que o «perfil» correspondia ao «modelo definido»: ausência de inquietações ideológicas, intelectuais ou de qualquer outra ordem…

(…) José Sócrates é apresentado nos media como o salvador. Excelente actor, é com pompa e ar de circunstância que diz a mais elementar vulgaridade como se de um juízo elaborado se tratasse».

Julgo que o processo de escolha transcrito ajuda a compreender por que razão os azares batem à porta de José Sócrates, sendo que o primeiro deles foi ter sido escolhido para primeiro-ministro. 

A transcrição ajuda também a encontrar a resposta à pergunta de como é possível esta irresponsável fuga às explicações devidas ao país? É que o silêncio fede.

Independentemente do que vier a dizer – não pode fugir durante muito mais tempo –, a sua teimosia na manutenção dos cargos que detém só pode arrastar consigo o PS e lançar o descrédito sobre o país, acrescentando dificuldades à crise que Portugal atravessa que também é, como agora se torna mais evidente que nunca, uma profunda crise moral.

Sócrates que concebe o mundo como uma realidade estática, tem uma concepção cesarista do poder que muitos confundiram, propositadamente ou não, com determinação. Rodeou-se de almas gémeas e juntos transformaram o PS numa associação de interesses para disputar eleições e distribuir tachos, onde os Congressos - como bem se viu no último em Fevereiro/Março de 2009 - não são espaço de debate e discussão de ideias mas espectáculos em louvor e consagração de José Sócrates, o chefe incontestado. 

O capital financeiro vai começar a demarcar-se. No Grupo Espírito Santo com o qual parecia haver uma mais íntima promiscuidade – não será por acaso que a PT é que arcava com o grosso dos custos de execução do alegado «plano» - o seu presidente, Henrique Granadeiro, já veio dizer que se sente «corneado» (sic) e que se preciso for convoca uma assembleia-geral Portugal Telecom. Outros guardarão silêncio, pois apenas a PT foi apanhada nas malhas do alegado plano, mas isso não quer dizer que mantenham o apoio ao que foi o seu mais fiel servidor desde a Revolução de Abril.

Na sua queda, Sócrates também provoca estragos na Justiça. Se as críticas ao Presidente do Supremo abrandaram ou mesmo desapareceram depois da sua maratona televisiva na passada semana, elas recrudesceram em relação ao Procurador-Geral da República. 

O PS mete a cabeça na areia como se não houvesse uma questão política que urge esclarecer. 

Apesar do aparente apoio de algumas figuras destacadas no aparelho do PS, como Capoulas Santos e António Costa que apelam à apresentação pelos partidos da oposição de uma moção de censura, e dos que perante a avalanche de indícios procuram aguentar Sócrates, como Mário Soares, muitos mais serão os que esperam o desenvolvimento dos acontecimentos para se demarcarem. Aparecem já as primeiras fissuras. Os jornais falam de Ana Gomes, de João Cravinho, de Vera Jardim e acrescentam que «Nas bases, também já há militantes que começam a falar da substituição de Sócrates…».

Hoje, Sócrates é já um cadáver político e muitos dos que estão calados apenas esperam que o desenvolvimento dos acontecimentos lhes diga o momento oportuno de reconhecer o óbito. 

O cadáver político está aí, a família que o enterre.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2010.

Retirei este artigo aqui

Sem comentários:

Enviar um comentário